Nota Histórico-Artistica: |
Dedicada a Nossa Senhora da Penha, a capela da Vista Alegre foi mandada construir pelo Bispo de Miranda, D. Manuel de Moura Manuel (1632-1699), na sua quinta, em Ílhavo. As obras, em fase adiantada no ano 1697, deveriam estar concluídas em 1699, data da sua morte. Contudo, os seus restos mortais foram para ali trasladados apenas em 1706.
Trata-se de uma igreja de características maneiristas, ao nível do espaço interno, caracterizada por uma série de elementos barrocos ou proto-barrocos, principalmente na fachada. Esta, apresenta duas torres sineiras que enquadram o pano central, onde se rasga o portal e o nicho de colunas torsas com a imagem de Nossa Senhora da Penha e o Menino. O conjunto, de linhas depuradas, é rematado por um frontão triangular de decoração ritmada com óculo central e cruz na empena.
A nave da igreja apresenta dois registos separados por uma moldura de pedra. No inferior, um conjunto de painéis de azulejos Setecentistas, de oficina lisboeta, ilustram cenas da Vida da Virgem. No segundo registo, abre-se a tribuna. É coberta por abóbada, onde se observa a pintura da Árvore de Jessé, que integra o conjunto de frescos que caracterizam o interior da igreja.
Na capela-mor, também com abóbada pintada a fresco (representando a Assunção da Virgem) e painéis de azulejo, destaca-se o retábulo-mor, de embutido marmóreo fino. O seu risco, de autoria desconhecida (PIMENTEL, 1989, p. 254), relaciona-se com outras obras do género, concebidas por João Antunes (SERRÃO, 2003, p. 171), o arquitecto de D. Pedro II que terá desenhado, na mesma época, o túmulo da princesa Santa Joana, patente no Mosteiro de Jesus.
Ainda na capela-mor, encontra-se o túmulo do bispo fundador da igreja, uma das peças mais interessantes de todo este conjunto. Concebido por Claude Laprade, o escultor francês que no final do século XVII traduziu o primeiro esforço de europeização nesta área (SERRÃO, 2003, p. 171), o Túmulo de D. Manuel de Moura Manuel "(...) é o mais significativo resumo das suas potencialidades de escultor e organizador de composições (...)" (PIMENTEL, 1989, p. 254). Inspirado, muito possivelmente, no túmulo do Abade La Coste (1688) desenhado pelos irmãos Perú ou no túmulo do Cardeal Richelieu, de Girardon, obras de tradição italo-francesa de carácter inovador (XAVIER, 1991, p. 189), este monumento funerário revela a figura do Bispo, no leito de morte, que se ergue perante a visão de Nossa Senhora da Penha de França. Aos pés do jacente encontram-se duas fénixes e um anjo que segura uma caveira. O Tempo, figura alada, de alguma idade, domina a zona superior da composição. Claramente barroca (na organização, no movimento e no horror ao vazio), esta obra assume, através da utilização dos símbolos e alegorias da época, uma iconografia da morte claramente pós-tridentina. Neste caso, o programa iconográfico foi estruturado em torno da ideia de ressurreição e vida eterna, para onde convergem todos os símbolos e alegorias empregues (XAVIER, 1991, p. 189). No contexto da produção tumular portuguesa do período barroco, este é um dos monumentos, "(...) a um tempo triunfal e macabro (...)" que introduz maior grau de inovação, em perfeita sintonia com o que de mais actual se produzia no estrangeiro, nomeadamente, em Roma (XAVIER, 1991, p.204). Ainda do mesmo autor será o baldaquino, em talha dourada, que se encontra no altar-mor, e o ossuário da mãe do Bispo.
Rosário Carvalho
(info disponível em https://servicos.dgpc.gov.pt/pesquisapatrimonioimovel/detalhes.php?code=70176. Imagem captada em abril 2024 @Google) |